5 de julho de 2004

"E, com estas palavras, conduziu Dutour a um pequeno e encantador aposento onde a amante de Raneville, que tinha sido informada da partida e estava a par de tudo, jazia deitada por sobre um sofá de veludo, sobre o seu corpo apenas um elegante penteador, a cara todavia coberta: nada escondia as provocantes curvas do seu corpo, mas o seu rosto permanecia invísivel. "Ora eis aqui uma mulher na verdade belíssima," exclamou o Dutour," mas porque me privais do prazer de admirar as suas feições, estaremos nós no serralho do grande senhor.?" "Não, nada disso, é uma questão de modéstia." "o que quereis dizer com isso?""penseias que eu pretendo exibir apenas o corpo ou os trajes da mina amante? Estaria o meu triunfo completo se, mesmo depois de terdes removido todos os véus, não vos convencesses de quão feliz eu estou por possuir tantos encantos...? Sucede que esta jovem mulher é extremamente modesta, pelo que estes detalhes a fariam corar; assim, aprestou-se a concordar com tudo isto, mas na expressa condição de estar coberta com um véu. Sabeis como é a modéstia e a delicadeza das mulheres, Senhor Dutour, não se defrauda um homem elegante e experiente como vós desta forma...""Mas o que é que me ides mostrar...?" "Tudo, tal como vos disse, tudo; ninguém é menos ciumento do que eu e, para mim, a felicidade não partilhada parece-me insípida e só a partilha me satisfaz." E como que para provar aquilo que acabara de dizer, Raneville removeu um véu de gaze finíssima que imediatamente revelou o seio mais belo que os olhos humanos jamais contemplaram... Dutour ficou excitado. "Bem" disse Raneville, "o que pensais disto?" " tão atraente como a própria Vénus.""Pensais que um peito tão branco e firme nao é feito para despartar paixões...? Tocai-lhe, meu amigo, tocai-lhe, os olhos por vezes enganam-nos, eu acredito que no prazer devemos utilizar todos os nossos sentidos." Dutour aproximou-se com uma mão trémula e tucou extasiado o mais belo seio do mundo, mal podendo acreditar na incrivel complacência do seu amigo. "Desçamos um pouco", disse Raneville levantando até à cintura uma saia de leve tafetá sem que a bela velada se opusesse a este movimento. "Então, o que me dizeis destas coxas, será o templo do amor sustentado por colunas mais belas?" O pobre Dutour continuava a apalpar tudo o que Raneville lhe ia revelando. "Velhaco, imagino como vos sentis," continuou o complacente amigo, " este delicado templo que as próprias Graças cobriram com um leve musgo...estais ansioso por abri-lo, não é assim? Que digo, por beijá-lo, aposto!" Dutour estava já ceho...gaguejou...e como única resposta exibiu as violentas sensações que os seus olhos deixavam transparecer; mas eis que o seu amigo insistia, e os seus dedos libertinos acariciaram as portas do templo que a própria voluptuosidade abriu aos seus desejos; deu o divino beijo que lhe foi permitido e saboreou-o durante uma hora."

"Contos Morais", Marquês de Sade

Sem comentários: